Faleceu Dom Anacleto Oliveira

O Secretariado Nacional de Liturgia informa que faleceu hoje, dia 18 de setembro, o Senhor Dom Anacleto Oliveira, bispo de Viana do Castelo e presidente da Comissão Episcopal da Liturgia e Espiritualidade.
Descanse na paz do Senhor.

De forma inesperada, para nós, foi convocado para celebrar os divinos louvores na Liturgia eterna D. Anacleto Cordeiro Gonçalves de Oliveira, Bispo de Viana do Castelo e Presidente em exercício da Comissão Episcopal da Liturgia e Espiritualidade.

Quem escreve estas linhas conhecia-o das reuniões mensais do Secretariado Nacional de Liturgia e dos Encontros Nacionais de Pastoral Litúrgica. Era um homem sereno, atento, afável, bem humorado. Pertinente e consistente nas suas intervenções, sempre se apoiava num conhecimento que era assimilação viva da Palavra revelada, objetivada na Escritura e, sobretudo, incarnada e viva em Jesus Cristo.

Bem reveladoras do seu modo de ser, recordamos as suas homilias nos Encontros de Pastoral Litúrgica em Fátima que desconcertavam alguns participantes, porventura à espera de um discurso formal e estruturado. Habitualmente não eram assim. Para ele, a homilia era, como a etimologia sugere – e ele era um filólogo competente –, uma «conversação familiar». Não eram «sermo» elaborado e proferido com o brilho da retórica. Quando muito seriam «tractatus» – para nos valermos de um antecedente patrístico – em que a Palavra de Deus manava, como o jorrar de uma nascente inesgotável, tando da Escritura que ele amava e conhecia visceralmente, como da vida que é também lugar de Revelação. E com o fluir manso da Palavra, qual arroio, discorriam as considerações do pastor que no mesmo ato em que gostosamente ruminava e se nutria do Verbo, partilhava com os irmãos esse saboroso alimento vital.

D. Anacleto presidia à Comissão para a nova tradução da Bíblia, projeto assumido pela Conferência Episcopal Portuguesa, do qual era o principal mentor, participante ativo e coordenador entusiasta.

Julgamos saber que, na génese desta iniciativa, terá estado a sua experiência na redação e revisão dos Catecismos Nacionais da Infância e da Adolescência. Os diversos colaboradores na redação dessa magna proposta catequética serviam-se das várias versões da Bíblia disponíveis em Português ou até vertidas «ad hoc» para a nossa língua a partir de versões de outros idiomas. Mas era imperioso coordenar e unificar, até para que não se propusessem na mesma obra versões diferentes do mesmo texto. D. Anacleto, cuja participação na Comissão Episcopal de Liturgia – ora como vogal, ora como presidente – já vem de longe, entendeu que a Bíblia da Catequese não pode ser senão a Bíblia da Liturgia: a palavra da Escritura proclamada nas celebrações tinha de ser idêntica à que a Catequese propunha e explicava. Mas logo se deparou com graves limites, quantitativos e qualitativos:
– Quantitativamente, nem toda a Sagrada Escritura tem lugar nos lecionários vigentes da Missa e da Liturgia das Horas: não há uma Bíblia Litúrgica integral em português;
– Qualitativamente, se excetuarmos a tradução do Saltério (em que participaram biblistas, linguistas, poetas e músicos), a versão litúrgica dos Lecionários depende mais da Neovulgata (edição oficial em Latim) do que das línguas originais da Sagrada Escritura.

Não poderia ser adotada – pergunta-se – uma das versões mais difundidas e já disponíveis no mercado livreiro? A resposta consensualizada – em que também a Associação Bíblica Portuguesa se reviu – foi diferente: as várias edições disponíveis estão pensadas para serem lidas; a Bíblia litúrgica tem de ser pensada para ser escutada! Será uma Bíblia mais para os ouvidos do que para os olhos. Sem abdicar em nada da fidelidade ao original, quantas diferenças na sintaxe e até nas opções lexicais! Uma coisa é traduzir uma Bíblia para o estudo, recorrendo a cada passo a expressões técnicas; outra é editar uma Bíblia para a proclamação, a oração e a catequese, isto é, uma «vulgata» em Português.

D. Anacleto fez sua esta causa e a ela se dedicava com o entusiasmo de quem encontrou na Escritura o alimento vital a que têm direito todos os fiéis. Impõe-se continuar esta obra que tanta falta faz à Liturgia, à Catequese e à Pastoral no seu conjunto.

2020-09-18 00:00:00